“O BRT pode, sim, ser uma boa solução para João Pessoa, mas é preciso planejamento”, diz Fabiano Melo
13 de março de 2015 |
Presidente do IAB-PB e vice-presidente da região Nordeste, o arquiteto e urbanista Fabiano Melo se prepara para receber em João Pessoa a reunião da Direção Nacional do IAB fora do eixo Sul-Sudeste. É uma forma de fortalecer a atuação do Instituto nacionalmente e de ampliar as discussões em torno de questões cada vez mais nacionais, como a mobilidade. O IAB Nacional conversou com Fabiano Melo sobre as questões que preocupam os arquitetos paraibanos.
IAB: Qual a importância para João Pessoa de sediar a reunião da Direção Nacional?
A decisão de tirar as reuniões da DN do eixo Sul-Sudeste é uma estratégia muito acertada porque fortalece e amadurece a presença do IAB no resto do país. Não à toa, estados como Ceará, Alagoas e Pernambuco, que não fazem parte da Direção Nacional, além da Bahia, já confirmaram presença. Fora isso, tem a expectativa em torno do painel aberto que será realizado e que é uma forma de dialogar com outros agentes, como gestores, construtores, professores. A gente espera iniciar um debate que possa render frutos para depois dessa reunião.
IAB: Na última semana, o Conselho de Proteção de Bens Históricos Culturais aprovou, com ressalvas e algumas modificações, o projeto de revitalização do Parque Sólon de Lucena. Como analisa este projeto que vai afetar uma das áreas turísticas mais importantes da cidade?
O projeto é polêmico. Desde o primeiro momento, o IAB-PB sempre defendeu o amplo debate com a sociedade e a realização de um concurso público, porque a gente entende que essa é a forma mais democrática e eficiente de se ter um projeto de qualidade. Mas a prefeitura – pragmática como tantas outras prefeituras do país – contratou um arquiteto diretamente, a quem a gente nunca teve acesso, e apresentou um projeto de baixa qualidade. Por causa da pressão de movimentos sociais – e a partir de uma mobilização iniciada pelo IAB-PB -, esse projeto acabou sendo trocado. O projeto atual é do Marcos Santana, um arquiteto que tem qualificação para fazer esse tipo de trabalho, já realizou outras obras desse porte. A gente continua achando que deveria ter sido feito um concurso. Isso evitaria, por exemplo, ressalvas na aprovação, pois essas questões certamente já estariam previstas no programa. A prefeitura alega que contratar um arquiteto é mais rápido, mas com todos os problemas, o concurso não só teria um resultado melhor, como também teria sido mais rápido, mais transparente e até mais justo com o processo de contratação.
IAB: Uma outra discussão que vem acontecendo em João Pessoa é em relação à mobilidade e à criação dos BRTs…
O problema de João Pessoa é que ainda não existe um plano de mobilidade. Todas as obras e mudanças que foram feitas nos últimos dois anos foram feitas sem esse plano, que precisa ser entregue até maio, por exigência legal. A prefeitura anunciou a ampliação e a criação de trevos na Beira Rio, que a gente criticou por não contemplar transportes não motorizados, como bicicletas. Além disso, anunciou o BRT sem ter o plano de mobilidade. João Pessoa é uma cidade média, com 700 mil habitantes, e cerca de um milhão na região metropolitana. Ainda está em tempo de resolver essa questão, mas já estamos chegando no limite. E por um caminho que vamos repetindo os erros de outras cidades.
IAB: Qual seria a melhor solução para a mobilidade de João Pessoa?
O primeiro passo seria fazer esse plano de mobilidade e pensar na sua aplicação a médio e longo prazo, que é o que tem de mais difícil no país, já que tudo é feito visando apenas os períodos eleitorais. Mas precisa ser um plano que privilegie o transporte coletivo e o não motorizado. Aqui ainda é forte a ideia de que o carro deve ser o protagonista do transporte individual. João Pessoa não tem escala para metrô. Então, o BRT pode, sim, ser uma boa solução. Mas é preciso ter um bom planejamento.
IAB: Do ponto de vista urbanístico, qual seria hoje o maior desafio de João Pessoa?
A questão da mobilidade está no foco de qualquer questão no Brasil, mas ela é um reflexo de um cenário urbano de falta de planejamento. Um grande avanço foi o Estatuto da Cidade. Mas, a aplicação dessas leis ainda está embrionária. Aqui, já se trabalha com outorga onerosa, por exemplo. Mas esse é apenas um instrumento. Existem outras formas de se combater a especulação imobiliária que, na minha opinião, é a causa dos dois maiores desafios que temos hoje: mobilidade e habitação. Toda crise urbana que a gente percebe tem sempre relação com mobilidade e habitação. Se a gente passa a entender a cidade como um sistema, combatendo a especulação imobiliária, otimizando os espaços com cidades mais compactas e fluidas, a gente começa a enfrentar esses desafios.