29 de agosto – Dia Nacional da Visibilidade Lésbica
29 de agosto de 2022 |
Neste dia 29 de agosto é celebrado o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. Esta data foi criada em 1996, durante a realização do 1º Seminário Nacional de Lésbicas (SENALE), organizado pelo Coletivo de Lésbicas do Rio de Janeiro (COLERJ). A partir de então, o dia 29 de agosto passou a representar um marco na luta das lésbicas pela visibilidade de seus direitos e posicionamento na sociedade como mulher e gay, enfrentando não apenas a homofobia e a lesbofobia, mas também a misoginia.
“Esse assunto ainda é um tabu em muitos lugares, sobretudo em regiões mais interioranas. E isso pode trazer problemas não apenas de ordem pessoal, mas profissional, quando o preconceito influencia o nível de credibilidade dado a um profissional”, analisou a arquiteta e urbanista paraibana, professora e pesquisadora Fernanda Rocha.
Mulher cisgênero lésbica, Fernanda acredita que tratar o assunto com naturalidade é a solução para normalizar essa questão. “Pensei que se queria que esse assunto fosse visto com naturalidade, teria que ser a primeira a tratá-lo assim. Então, não chegava para as pessoas, de maneira envergonhada, para dizer em tom baixo, medroso: “sou lésbica”. Heterossexuais não faziam isso! Num almoço com colegas de trabalho eu estava contando uma história e citei ‘minha namorada’ no meio de uma frase. Tempos depois, uma colega de trabalho admitiu que, na hora que ela me ouviu falar aquilo, trocou olhares com uma amiga dela, como quem dizia: ‘ouvimos mesmo isso?’ Para elas foi um choque alguém falar, tão naturalmente, de uma condição não normativa. Desde essa ocasião, vejo que agir com naturalidade me ajudou a não me sentir tão limitada pelo medo do preconceito”, contou.
Fernanda destaca a importância de dar visibilidade a esse tema para transformar a realidade. “Colegas lésbicas (ou bissexuais) também me relataram que, ao ouvirem minhas histórias e verem minhas atitudes sobre o tema, sentiram-se encorajadas a se assumirem. Apesar dessa ‘conquista’ de não precisar omitir minha sexualidade no ambiente de trabalho, não deixei de passar por experiências de lesbofobia, principalmente em faculdades privadas de arquitetura onde lecionei, e sobretudo por parte de colegas de profissão”, contou Fernanda.
“Mas pelo meu histórico de militar por minha liberdade (isso intimida algumas pessoas) e por gozar de uma série de privilégios, não sofri tanto quanto outras mulheres costumam sofrer – por mulheres, me refiro às diversas formas de ser mulher. Por isso entendo ser tão importante esse tipo de ação do CAU Paraíba em prol da visibilidade lésbica”.
A arquiteta e urbanista Fernanda Rocha faz parte do Grupo de Estudos sobre Gênero e Cidade (GECID), que é auto-organizado por mulheres que pensam a cidade sob a perspectiva de gênero, com enfoques interdisciplinar e interseccional. “Diante da ação do CAU Paraíba sobre o tema da visibilidade, resolvemos criar uma enquete na rede social do grupo (@gecid_cariri) perguntando quem já havia sofrido lesbofobia no ambiente de trabalho. Metade das mulheres que se consideravam não heterossexuais afirmou já ter sofrido esse tipo de preconceito. Entre as áreas de atuação dessas respondentes que vivenciaram esse tipo de violência psicológica estão: a música, o setor bancário, o magistério e a arquitetura. É interessante destacar que houve uma respondente que afirmou o seguinte, numa caixinha de diálogo: “ainda não sofri, mas acredito que por não saberem da minha sexualidade”. Destaco isso porque entendo que se policiar para não deixar transparecer sua orientação sexual já é um ataque à liberdade de se ser quem é”, analisou Fernanda.
De acordo com o 1º Diagnóstico de “Gênero na Arquitetura e Urbanismo” , realizado on-line, de julho de 2019 a fevereiro de 2020, levantamento foi respondido por 987 profissionais, sendo 767 mulheres e 208 homens, com uma margem de erro de 3,11%, para mais ou para menos, 4% se declararam homossexuais e 11% bissexuais. O diagnóstico foi elaborado pela Comissão Temporária de Equidade de Gênero do CAU/BR (CTRED).
1º Diagnóstico de “Gênero na Arquitetura e Urbanismo”
Dados da pesquisa realizada pela CTRED em 2021.
De acordo com pesquisa realizada pela Comissão Temporária de Equidade de Gênero do CAU/BR (CTRED) em 2021, 13% das mulheres que responderam ao questionário se declararam homossexuais.
“Não podemos nos contentar em viver numa sociedade onde apenas alguns se sintam livres de amarras e de preconceitos. Precisamos lançar novas práticas, se queremos mudar uma realidade que ainda não atende à necessidade de todos. O Dia da Visibilidade Lésbica é necessário para trazer à tona essas e outras questões que ainda afetam diversas pessoas, sobretudo se pensarmos numa ótica interseccional, já que para algumas pessoas essa é mais uma camada de preconceito que se soma a outras (como misoginia e racismo). É importante o aprofundamento do tema com pesquisas, verificando as formas que lésbicas e bissexuais sofrem preconceito em seu campo de trabalho, consequências disso em suas vidas, e subsidiando ações futuras de combate a essas práticas”, opinou a arquiteta e urbanista Fernanda Rocha.
Fernanda destaca dois trabalhos de conclusão de curso que abordam o tema para quem deseja saber mais. “Acho que é um tema que merece ser visto com carinho por arquitetes e urbanistas para tentar superar práticas de produção das cidades voltadas a um sujeito padrão (privilegiado), e do o urbanismo com perspectiva de gênero. Por meio dele, somos convidades a ponderar, em nossos planejamentos e intervenções citadinos, as subjetividades e formas de vivenciar a cidade de outros sujeitos, como as mulheres, as crianças e mesmo pessoas da comunidade LGBTQIA+. Nesse sentido, destaco os trabalhos de conclusão de curso de duas membras do GECID que são arquitetas recém formadas: “Diagnóstico e diretrizes projetuais baseadas no urbanismo com perspectiva de gênero, usando como objeto empírico a rua São Pedro, em Juazeiro do Norte-CE”, de Ana Clara Benjamim Silva; e “Proposta de intervenção urbana na Av. Padre Cícero em Juazeiro do Norte – CE, com embasamento no urbanismo com perspectiva de gênero, tendo como público-alvo a população LGBTQIA+”, de Carla Rayssa de Melo Silva”.
“Cidades que são boas para grupos de maior vulnerabilidade, também são boas para grupos de menor vulnerabilidade; mas o oposto não se aplica. Usemos nossa categoria como uma ferramenta de transformação social!”, finalizou Fernanda Rocha.